Piscinas Negras I, 2007
Um silencioso mergulho em busca do ser abissal. Assim pode ser descrito o trabalho da artista plástica e arquiteta Karen Axelrud. Uma aquosa escuridão recobre as suas telas, deixando entrever aos poucos, texturas, superfícies, ranhuras. Fendas talvez(?) por onde transitam seres secretos.
Em seu inquieto universo, Karen envolve o espectador nesta atmosfera (ou seria uma anti-atmosfera já que submersa?) tanto íntima quanto desconhecida. Suas nuances, mais do que camadas de tinta, traços de pincel, gestual de braço, são interstícios que se revelam, de um inconsciente no qual habitamos todos e onde ela acende aqui e lá sutis lanternas, presas a fios quase imperceptíveis.
Várias são as analises possíveis à produção artística. Numa interpretação puramente psicológica, a busca deste interior oculto, silencioso, a busca deste útero original do qual não nos lembramos mais, mas que permanece guardado dentro de nos, é evidente.
Numa visão mais formal, nos deparamos com a precisão arquitetônica nas linhas verticais e horizontais. Mas a que servirão estas linhas tão nítidas que se entrecruzam senão a uma tentativa de conter, de aprisionar o que parece querer transbordar do interior da tela? Pontos de sutura, talvez, querendo evitar uma hemorragia interna. Ou ainda, um pouco menos orgânico, um arcabouço, um alicerce no qual se apoia a estrutura maleável. Dai a permeabilidade de suas sobreposições.
Linhas, talvez sejam a negação a este ser medusal que teima em emergir. Se ousarmos ir um pouco mais além, podemos nos perguntar se são mesmo as linhas que cobrem a superfície, ou justamente o contrário, trata-se de sulcos, fendas submersas neste universo aquoso? Em todo o caso, é a oposição das duas estruturas, uma rígida e geométrica, outra liquefeita e expansiva que formam o equilíbrio/desequilíbrio da sua criação. Linhas que salvam ou que aprisionam, plasma que se expande ou que asfixia?
Se as referencias da artista se remetem a Rothko ou Mondrian, não é apenas no plano formal que se pode percebê-lo. A sóbria gama de cores, a repetição exaustiva dos gestos, a insistente sobreposição são apenas um veículo através do qual a artista deixa transparecer sua trajetória intima, mística talvez, irrevelada.
Não ha calma nestas superfícies opacas, opacos espelhos, mas uma ansiosa apnéia onde um mundo desconhecido se oferece.
Ainda, o ritmo assimétrico, o trabalhado-retrabalhado, a construção e destruição continua, o cobrir e descobrir, revelam uma intima esperança, um pulsar vital.
Suas telas não são janelas onde se possa ver através. São antes piscinas. Negras piscinas que nos convidam ao salto.
Themis Cheinquer
Paris, 2007